sábado, 4 de julho de 2009

Primeira Mesa de Debates - Inclusão e Acesso para Todos

A Organização da Sociedade Civil de Interesses Públicos ( OSCIP ) “Mais Diferenças” esteve ontem no Teatro do Jockey – Centro de Referência Cultura e Infância – para um debate sobre a necessidade da ampliação dos acessos para portadores de deficiência. Representada pelo administrador Luis Mauch, que mediou a mesa, a ONG levou ao teatro, como convidados, Marcelo Yuka e Leda Spelta. A seguir, um resumo do que foi dito pelos três componentes da mesa. Obs: o debate, assim como todas as atrações do FIL, foi filmado; o link para o video estará disponibilizado neste blog a partir do dia 13 de julho - o FIL acaba dia 12, mas suas atrações continuam vivas.

Luis Mauch “O conceito de deficiência é o de uma limitação funcional. O deficiente físico, como o Marcelo, não anda como uma pessoa sem limitação. Ele, e todos os demais deficientes físicos, invariavelmente, passam por ambientes despreparados para recebê-los. No momento, porem, em que o espaço se adapta a deficiência do Marcelo, ela simplesmente deixa de existir. O conceito é, erroneamente, ligado a pessoa. Na verdade, se o ambiente se adapta a deficiência, o acesso de todos é garantido e quem possui deficiência se torna tão apto quanto quem não tem. Deficiência é igual a limitação funcional vezes ambiente. Se a deficiência é um, e o ambiente é cinco, a deficiência é cinco. Se o ambiente, adaptado, é zero, a deficiência é, também, zero.”

Marcelo: “Eu tenho a possibilidade, como músico e espectador, de estar nos dois lados do espetáculo. A partir disso, vejo problemas que são endêmicos da cultura brasileira – e, possivelmente, de outras culturas - em relação a acessibilidade. Nós temos uma arquitetura muito elogiada pelo mundo inteiro, baseada numa percepção comunista. Um bom exemplo é Brasília, que comporta edifícios de estética muito interessante, com grandes rampas, que foram feitas com a finalidade de tornar o acesso um bem de todos. Na verdade, esse pensamento de acesso ao poder exclui os deficientes. Isso não pode ser tratado como uma questão ética, pois muito mais do que uma visao ideológica, a acessibilidade tem de ser vista sob o ponto de vista humanizante. Pelo meu ponto de vista, a acessibilidade também está cunhada em uma razão econômica. A visão comum é a de que alguém que produz e gera dinheiro tem de ter acesso. Quando você é bebê, há alguém que gera renda pra você, você não produz. O idoso enfrenta o mesmo esteriótipo e é este esteriótipo o que ainda cai sobre os deficientes de maneira geral. O acesso, para quem não gera dinheiro na visão comum, não existe em condições corretas. Ocorre, por outro lado, que, com o aumento da violência nas cidades e o aumento da tecnologia dos automóveis em relação a velocidade e tamanho, houve uma mudança, no Brasil, em relação ao deficiente. Os pobres tinham mais propensão a esse tipo de deficiência, por dificuldades numa pré-natal ou por viverem em areas mais violentas. Hoje, isso muda não por se buscar justiça, mas por classes mais consumidoras de arte estarem sendo mais lesadas também. Isso é algo muito sério a se pensar. A cultura brasileira é muito gentil. Se eu chegasse no teatro e não houvesse rampas de acesso, certamente haveria alguém pra me ajudar, e eu ficaria muito grato. Mas isso, em última análise, não é direito. Eu não quero direito a solidariedade. Isso não é prepotência, isso é o básico. Quando discutimos o acesso do deficiente à cultura, nós estamos discutindo que sociedade é essa. Isso me interessa mais. Por que e como ela pensa sobre inclusão. E por que e como ela não pensa. Quando ela pensa, eu tenho dúvidas. Quando ela não pensa, eu tenho mais dúvidas ainda.”

Leda Spelta: “A primeira questão que me vem na mente é a da audio-descrição. Se veincula a audio-descrição à importância e qualificação dos audio-descritores, pois eles tem que entrar cirurgicamente no intervalo entre os diálogos, sendo preciso muita qualidade para não atrapalhar o andamento do espetáculo. Aqueles elementos de uma cena - de um filme, uma peça, um espetáculo circense ou de dança -, que tenha elementos visuais acontecendo que sejam importantes para a compreensão da obra; tudo o que a compreensão natural seria pela visao, tem de ser substituído pelos audio-descritores. Esses recursos visuais podem ser óbvios como podem ser muito sutis, podem envolver iluminação, figurino ( … ) e, sem elas, não há a compreensão completa. O texto precisa ser criado nos intervalos em que o espetáculo permite que haja uma explicação desse gênero. Outra: se uma mulher entra no palco, a audiodescrição não pode dizer que ‘a mãe do rapaz entrou no palco`, num caso em que a identificação da personagem como `mãe` só aconteça posteriormente. É preciso que haja a explicação das informações que são dadas; nada a mais e nada a menos. O Brasil ratificou a convenção da ONU sobre pessoas com deficiência, e isso tem efeito imediato. Ela coloca aspectos interessantes sobre a cultura, sobre o direito à cidadania sobre o direito humano. Queria finalizar falando sobre uma coisa desagradável, que é o fato de não estarmos conseguindo o apoio do governo para a audio-descrição para a televisão. Esperamos que agora, um ano depois de assinarmos a convenção, isso mude. Na hora de pagar imposto a gente não paga mais ou menos. A gente paga. Os direitos nossos não podem ser maiores ou menores, tem de ser justos.”

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